A Secretaria de educação vai remanejar educadores para Cambaíba, a fim de que possam ministrar aulas no próprio acampamento, de acordo com as especificidades da comunidade rural
Foto: Wellington Rangel
A Secretaria Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia (Seduct) iniciou a modalidade de educação do campo no Acampamento Cícero Guedes, em Cambaíba. Na sexta-feira (15), o secretário da pasta promoveu uma ação multiprofissional no local, fechando a semana de comemorações pelo Dia das Crianças e Dia dos Professores. O ato teve caráter Inter setorial e reuniu o Departamento Pedagógico, Coordenação de Educação do Campo, Serviço Social, Supervisão Escolar, Coordenação de Educação Infantil, Coordenação de Ensino Fundamental, além da Secretaria Municipal de Saúde.
A Seduct vai remanejar educadores para Cambaíba, a fim de que possam ministrar aulas no próprio acampamento, de acordo com as especificidades da comunidade rural. O objetivo é promover a inclusão educacional e social das crianças do acampamento e suas famílias. A equipe – que foi recebida pelos acampados com música - ofertou carteiras para a escola do acampamento, kits escolares, orientação para retirada de documentos pessoais, sementes de leguminosas como fava branca e feijão de lima, orientação para matrícula e transferências escolares.
A Secretaria de Saúde aplicou 70 doses de vacina contra a covid-19 e 22 doses de outros imunizantes de rotina do Programa Nacional de Imunização, em crianças e adolescentes. O secretário de Educação, Marcelo Feres, está acompanhando os trabalhos de perto e visitou a localidade pela terceira vez. Na semana passada, promoveu reunião com a diretora da Escola Municipal Dr. Luiz Guaraná, Eliana Gomes.
“Nas outras visitas, levantamos as demandas e necessidades. Outros setores da Administração Pública estão presentes aqui e o próprio prefeito já visitou o acampamento. Estamos aqui para possibilitar que os estudantes tenham um ambiente de aprendizagem propício para que possam se desenvolver. A educação do campo que queremos é a que pensa a partir da realidade que temos aqui. Ter a estrutura da escola formal, física, aqui ao lado do acampamento também é fundamental para garantirmos a interação social com os demais alunos da escola regular. E mais que isso: teremos professores aqui para desenvolver as atividades nesse espaço que é de vocês. Nós acreditamos nesse modelo de educação”, garantiu o secretário.
Segundo Luana Carvalho, uma das coordenadoras do Acampamento Cícero Guedes, ligado ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), há cerca de 270 famílias no local - aproximadamente 600 pessoas. Desse total, cerca de 50 são crianças.
“A primeira ocupação aqui foi nos anos 2000. Houve muita luta, muita resistência, muito acampamento, despejos e pessoas assassinadas como o companheiro Cícero Guedes. Mas seguimos firmes, resistentes. Estamos aqui hoje com uma grande conquista que foi a desapropriação. Nossa principal luta é garantir que o Incra assente todas as famílias e construa um assentamento nessas terras. Ficamos felizes agora por saber que poderemos contar com uma educação de verdade que fale a nossa linguagem. Os educadores devem pensar em uma educação que seja idealizada para os sujeitos que vivem no campo”, comentou Luana.
A diretora pedagógica, Tânia Alberto, conversou com os acampados. “Estou muito emocionada, pois, desde 2009, estamos tentando garantir uma educação pública de qualidade que atenda os sujeitos nos lugares em que eles estão inseridos, do jeito que eles merecem. O antigo formato de educação que vem de cima pra baixo não forma pessoas, forma seres para reproduzir a mesma coisa. Agora, estamos construindo uma educação que seja libertadora. Em qualquer lugar podemos ter uma vida feliz e digna. Sou grata a esta gestão que está nos permitindo promover a inclusão de todos”, destacou.
Aparecida Lobato é ligada ao setor de educação do MST Regional Norte e professora da rede municipal há 14 anos, atuando sempre na área rural. Ela é uma das educadoras que vão atuar no Acampamento e falou sobre os próximos passos. “A gente vai se reunir com o grupo do Acampamento e da Secretaria a fim de desenvolver um trabalho com a pedagogia da alternância, com hortas, cuidados com a saúde e outros temas relacionados à realidade deles. Vamos propor tarefas a partir da realidade do campo, provavelmente com turmas multisseriadas. Faremos uma análise para diagnosticar o nível educacional de cada criança. Amanhã (sábado, 16), faremos a Festa em Comemoração ao Dia das Crianças, com atividades pedagógicas, contação de histórias, brincadeiras, etc. Estou feliz por ter a oportunidade de ver a educação do campo de fato acontecendo. Que seja digna e de qualidade para todos.
O coordenador da Educação do Campo da Seduct, geógrafo e professor da rede municipal de ensino, Marcelo Vianna, é especialista no assunto e sua tese de doutorado trata sobre essa temática. “Esse não é um trabalho de uma coordenação. É fruto de vários agricultores sem terra, do coletivo de educação do campo, vai além das letras e do texto. A educação do campo contextualizada nasce para contrapor à educação rural formal que não tem sentido na vida dos camponeses; parte da vida concreta e diária de quem vive no campo. É um direito do povo. Muitas crianças e jovens acompanharam os pais construindo suas casas aqui. Isso é sabedoria do campo. Eles estão aprendendo os primeiros passos da engenharia, da poesia e da vida aqui. Educação do campo é articulação das políticas públicas do campo, é uma conquista que se transforma em realidade com diversas parcerias e nó, enquanto educadores, temos a função de fortalecer essas experiências”.
Para a diretora Eliana, é preciso olhar para fora dos muros da escola. “Nossa função é fazer a mediação para que a educação tenha o verdadeiro sentido, respeitando os espaços e limites de cada um. A escola está de portas abertas para receber essas crianças também, se for da vontade de vocês, e orientá-los no que for preciso. Sou diretora há 7 anos e valorizo demais o trabalho de vocês bem como a Educação. Acredito que não pode haver limites para avançar quando se trata de conhecimento”, disse.
A representante do Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (Sepe), Graciete Santana, disse que o momento é de muita reflexão e emoção. “Hoje não é um dia qualquer. Estamos no ano do centenário de Paulo Freire que luta pela educação emancipadora. A gente quer que saiam daqui futuros engenheiros, professores, médicos. É necessário investir nesse processo. Parabenizo ao professor Marcelo e a todos da Secretaria de Educação, porque hoje está iniciando um novo tempo para a educação de Campos”.
Reportagem: Kamila Uhl
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